segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Qualificação não é somente formação acadêmica

Por Cícero Domingos

O vice-presidente de talentos do Gupo Algar, Cícero Penha, fala sobre as dificuldades que muitos profissionais encontram para entrar no mercado de trabalho e o que exatamente as companhias procuram.
Os mais atentos sabem que o mercado de trabalho mundial privilegia, hoje, o talento qualificado. Poucos, entretanto, entendem o significado do termo "qualificação" sob a ótica das organizações.
Com a ilusão de que o sinônimo de qualificação é somente a formação escolar, milhões de recém-formados, em todas as categorias, engrossam as filas de desempregados. Estão com o "canudo" debaixo do braço, em busca de uma oportunidade para demonstrar suas qualidades aprendidas em anos de luta e esforço acadêmico. Mas as organizações levam em consideração, além da formação escolar, inúmeros outros atributos difíceis de ser copiados. Por isso, os processos seletivos das empresas dispensam uma média de oito em cada dez candidatos, somente na primeira etapa.
A busca em vão traz decepção aos suplicantes e aumenta a incredulidade da sociedade, que assiste petrificada à penúria desses talentos que, na sua visão, fizeram tudo certo. Mas dá tudo errado.
Afinal, o que há de errado? Para o mercado, é considerado "qualificado" aquele que, além da formação escolar, possua outras qualidades que o tornem um potencial no qual vale a pena investir. Algumas dessas qualidades são capacidade de pensar, intimidade com informática, iniciativa própria, poder de argumentação, capacidade de imaginar coisas novas, capacidade de perceber e abstrair, capacidade de criar soluções e, acima de tudo, habilidade de relacionamento com pessoas.
Se a vaga é para algum cargo executivo, além dos atributos acima, avalia-se também o domínio de pelo menos uma língua estrangeira, capacidade de liderança e a visão global do candidato. Neste caso, ele precisa demonstrar habilidade para estimular pessoas e estar atualizado em relação aos panoramas econômico, político e social. Muitos formados têm dificuldade até mesmo para redigir uma carta. Muitas vezes não têm argumentos, poder de convencimento ou a simples capacidade de narração de um fato.
As empresas estão cada vez mais atentas, aperfeiçoando seus processos de seleção através de dinâmicas de grupo e outras práticas que detectam essas qualidades ou sua falta. Nas entrevistas, além dos conhecimentos técnicos e as qualidades já citadas, os entrevistadores dão muito valor à visão geral do talento, como ele pensa e como vê o mundo, as grandes questões empresariais e a missão do cargo que pleiteia.
Por que as empresas agem assim? Há três motivos básicos. Primeiro: atualmente o investimento em formação e treinamento nas organizações precisa ser contínuo. Isto custa caro e elas querem ter certeza de que estão investindo em quem tem base e potencial para dar respostas positivas a esse investimento. Segundo: hoje em dia, há pressa e ninguém tem muita paciência para ser repetitivo com pessoas que "só pegam no tranco", como se diz no jargão gerencial. Terceiro: elas precisam de pessoas que façam o diferencial, ou seja, que agreguem idéias novas, entendam e valorizem o significado do cliente por meio de ações rápidas e criativas. Esta é a maneira de garantir faturamento que gere lucro, garanta a remuneração do capital investido pelos acionistas e crie novos empregos.
O jogo no mundo dos negócios é implacável com a empresa que não agir assim. O preço é a falência ou a incorporação por outra mais profissional. Por isto exigem tanto de quem é candidato.
A grande pergunta é: "Quem consegue reunir, hoje, como profissional, todos esses predicados, uma vez que a maioria deles não se aprende na escola?" Com certeza são poucos. Esta é a razão pela qual poucos conseguem boas colocações, e as empresas estão com sérias dificuldades em encontrar bons talentos com o perfil que procuram.
Olhando com frieza, infelizmente, o quadro de desemprego que o País ostenta neste momento e visto sob este prisma, é considerado normal. Tenho, entretanto, a convicção de que esta situação é passageira porque, com o passar do tempo, as pessoas irão perceber essa realidade e tratarão de se qualificar também sob a ótica desses outros atributos. A qualificação, no sentido amplo, é essencial para se obter sucesso profissional em qualquer modalidade de trabalho, mesmo o liberal e o autônomo. Uma saída é a empresa se planejar com antecedência e incrementar planos de "trainees" que ofereçam oportunidades de uma preparação mais abrangente a esses jovens potenciais.Cícero Domingos Penha é vice-presidente de Talentos Humanos do Grupo Algar.

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